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Acabei de ver uma propaganda de uma empresa de cosméticos com o seguinte título: “Ser homem é muito maior do que ser macho”. Apesar do claro apelo comercial, a campanha joga luz sobre um tema de grande relevância e que tem sido pouco discutido nos dias atuais. Existe uma pressão fortíssima na sociedade para que o homem siga à risca o modelo do macho tradicional, que é comumente representado pela figura caricata do cowboy. Quando o homem segue esse modelo, ele é valorizado por ser corajoso, violento, inflexível e insociável, tendendo a morrer mais cedo inclusive. A ciência do comportamento há muito tempo já comprovou que um comportamento, ao ser valorizado ou premiado, tende a ter sua frequência de ocorrência aumentada. O não reconhecimento desse fato científico abre e pavimenta o caminho para a naturalização desse modelo, que não é natural. É construído. É produzido e mantido por algumas práticas sociais de nossa tradição. E aqui vale ressaltar que há muitas práticas tradicionais que devem ser reproduzidas, pois trazem melhor qualidade de vida para as pessoas. Há outras, todavia, que precisam ser modificadas para o bem geral não só da nação, mas do mundo em que vivemos.

De modo geral, o que normalmente não se percebe é que esse modelo está voltado não apenas contra a mulher, mas também contra o próprio homem. É como se o homem armasse uma armadilha e ele mesmo colocasse o pé dentro. Depois de ser vítima de sua própria armadilha, ele normalmente atribui a alguma outra coisa ou alguém as razões aqui discutidas de seu sofrimento. Na verdade, essa armadilha é armada por uma grande parcela de homens e mulheres, que colocam os pés nela sem saberem que a armaram. Já bastam as agruras da vida. Se reduzirmos ou eliminarmos os problemas que nós próprios criamos, iremos colaborar muito mais para realizar o que vem sendo proclamado aos quatro cantos nos lugares mais sagrados. Já discuti um pouco esse tema no texto Identidade Masculina em Crise, mas gostaria de fazer mais essa breve reflexão.

Quando o Tiro Sai pela Culatra

O comportamento que reproduz o modelo acima referido produz como consequência a perpetuação da violência contra mulheres e homens. Nos últimos 50 anos, mulheres comprometidas com seu processo de emancipação têm trazido à tona discussões relativas à violência entre os gêneros. Por outro lado, é facilmente perceptível o baixo número de reflexões da sociedade de modo geral, no que se refere aos malefícios do machismo contra o próprio homem. Os homens que se libertam do modelo do cowboy tendem a viver com menos ansiedade. Inclusive, a tentativa dos homens de impressionar a parceria, passando uma imagem forte e infalível, costuma levar a perdas de ereção. Isso ocorre porque, ao entrar no que poderíamos chamar de modo cowboy, os homens passam a apresentar uma forma de ansiedade, que é conhecida na literatura psicológica como ansiedade de desempenho. Um dos sintomas da ansiedade é a contração muscular, que normalmente impede o fluxo de sangue na região peniana, levando a um episódio de falha eretiva.

Empoderamento Masculino e Empoderamento Feminino

A emancipação feminina vem junto, de mãos dadas, com a emancipação masculina, porque mulheres e homens são oprimidos pela mesma coisa, o machismo. Esses supostos opostos antagônicos podem ser complementares. O antagonismo não é criado pelos homens (seres humanos), mas pelo machismo (regra), que pauta a conduta de muitos homens e mulheres. As mulheres e homens que não cobram esse modelo de outros homens costumam experimentar maior harmonia em suas relações.

Há uma crença em nossa cultura de que a competição entre os membros de um casal estimula o casamento. Isso é um mito, ou melhor, um pensamento disfuncional. Dr. Arnold A. Lazarus, professor de psicologia, psicoterapeuta e palestrante internacionalmente reconhecido, afirmou em seu livro Mitos Conjugais que “a competição entre marido e esposa é o mesmo que dar tijolada nas vidraças da própria casa” (1992, p.113). Ainda segundo ele, “a competição corrói a essência do companheirismo e a confiança, que é a base de um bom casamento (1992, p.113). É preciso menos competição e mais colaboração, para que haja maior empoderamento de cada membro do casal e maior satisfação nos relacionamentos.

Separando o Joio do Trigo

É preciso separar o joio do trigo e entender que homem não é tudo igual. Esse é mais um pensamento distorcido. Há homens que agem a partir de regras machistas e há outros que não o fazem. Se punirmos todos, não haverá solução satisfatória para a questão. Os homens que procuram se conhecer e se transformar para se tornarem pessoas melhores precisam ser distinguidos dos demais e valorizados. Cada homem é único e tem o direito de vivenciar sua masculinidade de maneira única. Nesse sentido, podemos dizer que há tantas masculinidades quanto há homens sobre a Terra. O casal que consegue estabelecer uma parceria saudável, em que um apoia o outro e vice-versa, costuma desconstruir conceitos ultrapassados que destroem o vínculo afetivo. É através dessa desconstrução que se torna possível parar de agir como um robô a partir de meia dúzia de clichês obsoletos e adotar uma postura de maior respeito aos outros e à vida.

Esse é um texto meramente pedagógico e não tem o objetivo de substituir consulta por profissional especializado. Caso você tenha alguma dificuldade no campo de seus relacionamentos afetivos, sugiro procurar a ajuda de um psicoterapeuta que tenha conhecimentos teóricos e experiência prática na área.

Texto de autoria do Psicólogo Alexandro Paiva.

Referências:

Lazarus, Arnold A. Mitos Conjugais. Campinas, SP – Editorial Psy, 1992.

https://alexandropaiva.com.br/identidade-masculina-crise/

Alexandro Nobre Paiva é Psicólogo Clínico, Psicoterapeuta Sexual e de Casais (CRP 06/118772) com experiência no atendimento de clientes brasileiros e estrangeiros adultos, nas línguas inglesa e portuguesa. Especialista em Terapia Comportamental Cognitiva em Saúde Mental pelo Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (AMBAN IPq HC FMUSP) e pela Proficoncept, certificada pela DGERT (União Europeia). Qualificação Avançada em Psicoterapia com Enfoque na Sexualidade pelo Instituto Paulista de Sexualidade (INPASEX). Capacitação em Reabilitação do Amor Patológico pelo Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (AMBULIM IPq HC FMUSP) e pela Escola de Reabilitação do Amor Patológico (ERA-AP). Membro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC).

Especialista em Língua Inglesa: Metodologia da Tradução pela FAFIRE, tendo atuado como Professor de Língua Inglesa por cerca de 10 anos (Brasil e China) e convivido com pessoas de diferentes culturas, mantém um Blog com Recursos Psicoeducacionais nas áreas da Psicologia e da Sexualidade.

Interesses principais incluem Psicologia, Sexualidade, Tradução, Línguas Estrangeiras, Viagens e Fotografia.

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