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Enquanto uns dizem que problemas psicológicos como ansiedade, depressão, dentre outros, são caprichos exclusivos de pessoas que já têm a vida ganha, outros dizem que tais problemas afligem apenas aquelas pessoas que estão lutando para sobreviver. A grande verdade é que os problemas, não apenas os psicológicos, mas os problemas em geral, estão entre as coisas mais democráticas do mundo, uma vez que atravessam as mais diferentes classes sociais, faixas etárias e demais recortes que se possa imaginar.

É verdade que pessoas diferentes têm problemas diferentes, mas uma coisa é certa: todo mundo tem problema. Se, na tentativa de evitarmos problemas, ficarmos sentados em uma cadeira sem fazermos absolutamente nada, será apenas uma questão de tempo para os problemas aparecerem. Sim, eles vêm por conta própria e se insinuam em nossas vidas sem serem convidados, mesmo ‘sabendo` que são persona non grata. Em pouco tempo, chega a sede, a fome, o cansaço, uma necessidade de resolver algum contratempo que alguém criou em sua vida, etc. Sim, as pessoas têm esse poder de criar um ou mais problemas em sua vida. Basta elas quererem fazer isso. É péssimo saber que isso é assim, mas isso é assim. Se imaginássemos cada pessoa na face da Terra como um círculo e aproximássemos todos esses círculos de uma maneira que conseguíssemos gerar uma área de interseção entre eles, certamente nessa área de interseção poderíamos escrever a palavra problema. Os problemas da humanidade são diversos e variam não apenas em função da latitude e longitude, mas também em função de outros fatores, a exemplo do nível socioeconômico das pessoas.

É consenso geral que pessoas com menor poder aquisitivo tendem a ter maiores dificuldades em serem felizes, devido às adversidades produzidas pela escassez de dinheiro em suas vidas. Isso é um fato inegável. Falta de dinheiro no mundo em que vivemos é um problema que gera vários outros problemas. Quanto a isso, o consenso é geral. Mas um consenso que parece não ser tão geral assim é o que se refere ao fato de que, assim como a escassez, o excesso de dinheiro tende a trazer problemas para a vida das pessoas também. Em muitos casos, não precisa nem haver excesso, basta uma quantidade razoavelmente maior do que aquilo que a maioria das pessoas tem.

Um dos perrengues enfrentados por pessoas mais abastadas é a dificuldade em confiar nas pessoas ao seu redor. Fica sempre aquela pulga atrás da orelha em relação às reais intenções daquelas pessoas. Essa é uma pulguinha chata que fica atrás da orelha não só em relação às pessoas já conhecidas, mas também em relação às novas pessoas que vão chegando. Sempre que uma nova pessoa é conhecida, a pulga grita lá de trás: ‘quem é essa pessoa?’; ‘o que ela quer de mim?’; ‘ela está simpática e sorridente, mas deve ser por causa da minha grana’. Não precisamos ir muito longe para percebermos que esses questionamentos constantes vão, aos poucos, gerando um ambiente mais tenso na vida diária das pessoas mais ricas. E isso vai se tornando um problema ainda maior quando entendemos que um mínimo de confiança é necessário para que qualquer pessoa possa ter relacionamentos mais satisfatórios e significativos. O nível de confiança é inversamente proporcional ao nível de tensão. Quanto mais você confia, mais você consegue relaxar na presença do outro. A confiança é a base que permite a construção de vínculos mais seguros e profundos com as pessoas, incluindo o vínculo estabelecido com a parceria amorosa.

Uma dica aqui seria observar os padrões de comportamento de seu parceiro ou de sua parceira ao longo do tempo. Através da observação desses padrões, você pode ir verificando se essa pessoa costuma fazer as coisas que diz que faz. Você pode observar isso não apenas quando ela age em relação a você, mas também quando ela age em relação às outras pessoas. É importante também prestar atenção quando ela fala sobre o modo como ela agiu em relação às outras pessoas.

Há um provérbio japonês que ilustra bem essa situação e que diz: ‘se quiser conhecer um cavalo, monte nele; se quiser conhecer uma pessoa, conviva com ela’. De fato, na hora de comprar um cavalo, não é suficiente olhar para ele e ver que ele é bonito ou tem alguma outra característica física admirável. Sua avaliação ficará mais completa se você experimentar montar nele e ver como ele se comporta ao longo de algum intervalo de tempo que permita perceber aspectos ainda mais relevantes sobre ele. Obviamente que de modo diferente, é também necessário algum tempo para que a confiança em uma pessoa possa ser construída. Ao longo desse período de ‘test drive’ da relação, você poderá também ir identificando os valores dessa pessoa e se esses valores são compatíveis com os seus. E mais ainda, você também poderá identificar se as ações dessa pessoa costumam estar alinhadas com esses valores que vocês compartilham.

Um outro perrengue que costuma atormentar as pessoas mais abonadas, seja por herança ou por conquista através de trabalho e esforço, é uma ausência de sentido e ambição na vida. Não é sempre que isso acontece, mas é algo que costuma acontecer. É muito comum que muitas pessoas que não são ricas pensem que quando ficarem ricas todos os seus problemas estarão resolvidos. Ocorre que algumas dessas pessoas, por mais esforço que façam, não ficarão ricas e poderão inclusive seguir na vida achando que um dia o enriquecimento trará a grande felicidade. Já as pessoas que, de fato, conseguiram se tornar ricas, percebem que o dinheiro traz maior segurança e liberdade de escolha, mas que não é suficiente para trazer o tão sonhado sentido de vida. E quando alcançam a riqueza sem terem encontrado um sentido para a vida, é comum que se deparem com uma espécie de chatice cotidiana, uma monotonia incessante que carece de tempero, que carece daquele algo mais. Isso é algo bem descrito pelo cantor e compositor brasileiro Raul Seixas na canção ‘ouro de tolo’, quando diz: “eu devia estar contente / por ter conseguido tudo o que eu quis / mas confesso abestalhado / que eu estou decepcionado / porque foi tão fácil conseguir / e agora eu me pergunto: e daí? / eu tenho uma porção de coisas grandes / para conquistar e eu não posso ficar aí parado”. E mais adiante na mesma canção ele diz: “eu que não me sento / no trono de um apartamento / com a boca escancarada cheia de dentes / esperando a morte chegar”.  Esses trechos da canção descrevem bem essa situação peculiar resultante da conquista material acompanhada da ausência de sentido na vida. Esse tipo de contexto é um terreno fértil para o aumento de frequência de vários tipos de comportamento compulsivo, que costumam gerar prejuízos na vida da própria pessoa e na vida daqueles com quem convive. É um terreno fértil para o consumo desenfreado de substâncias químicas diversas, além de outros possíveis supostos antídotos para o vazio existencial, tais como comida, compras, jogos, etc.

Encontrar um sentido para a vida é algo muito peculiar a cada pessoa, mas fica aqui uma dica: envolver-se em atividades que envolvem ajudar outras pessoas é algo que as pesquisas são consistentes em dizer que traz sentido para a vida. Quando nos envolvemos, por exemplo, em atividades de voluntariado, não apenas tendemos a nos sentir bem quando ajudamos, mas também quando construimos relacionamentos com pessoas que estão na mesma ‘vibe’, ou seja, pessoas que também estão se propondo a ajudar outras pessoas.  Realizar atividades dessa natureza e construir esses vínculos ao longo do caminho podem ajudar a trazer mais sentido para a vida, na medida em que facilitam o alcance a camadas mais profundas da existência.

E por último, mas não menos importante nessa lista, há também uma outra coisa, cujo déficit pode dificultar a vida dos mais ricos. Esse é mais um perrengue, dado que pode trazer prejuízos à vida da própria pessoa e das pessoas com quem convive. É o que os pesquisadores Dr. Justin P. Brienza da Escola de Negócios da Universidade de Queensland na Austrália e o Dr. Igor Grossmann da Universidade de Waterloo no Canadá chamam de wise reasoning. Basicamente, o wise reasoning é a habilidade de reconhecer os limites do próprio conhecimento; de considerar o mundo como algo que está em constante fluxo e mudança; e de reconhecer e integrar diferentes perspectivas. O que os autores do estudo sugerem é que pessoas de classe social mais alta tendem a apresentar uma menor probabilidade de utilizar o wise reasoning no contexto de seus relacionamentos interpessoais. A baixa utilização do wise reasoning está associada a uma capacidade reduzida de adaptação a situações de adversidade e de lidar com resultados inesperados no âmbito dos relacionamentos interpessoais. Trata-se de uma espécie de armadilha em que a pessoa pode cair, tendo em vista que pode desenvolver uma postura menos flexível e menos empática nos relacionamentos. Refere-se ao desenvolvimento de uma visão mais rígida de como as coisas deveriam ser e uma menor disponibilidade para lidar com as diferenças de perspectiva e conflitos presentes nos relacionamentos interpessoais. Lembrando que o fato de os pesquisadores encontrarem essa possível associação não significa que todas as pessoas de classe mais alta utilizem menos o wise reasoning. Cada pessoa é única e vai construindo suas habilidades na vida de maneira única também. E um outro ponto importante a ser ressaltado é que essa possível dificuldade não tem nada a ver com o que a pessoa é, mas com habilidades que podem ainda não ter sido desenvolvidas e que podem ser aprendidas e desenvolvidas através do exercício cotidiano com esse foco. Assim como treinamos a musculatura abdominal, é perfeitamente possível que treinemos também as ‘musculaturas’ da flexibilidade e da empatia.

Como já dito aqui, você pode ser uma pessoa rica e não ter essa dificuldade. Há vários exemplos no mundo de pessoas riquíssimas e que são bastante flexíveis e empáticas. Várias pessoas generosas e que se dedicam a atividades como filantropia, etc.  Mas, caso você identifique essa dificuldade em você, uma dica aqui seria fazer o exercício de tentar ouvir atentamente ao que seu parceiro ou parceira tem a dizer sobre algum fato que tenha ocorrido. Procure fazer perguntas como: ‘como você enxergou aquela situação?’; ‘o que você sentiu quando aquilo aconteceu?’; ‘como foi para você vivenciar aquilo?’. Tudo que a gente repete tende a virar um padrão. Criar os hábitos de fazer essas perguntas e escutar as respostas com atenção pode ajudar a enxergar o lado do outro e gerar uma reflexão sobre como seria vivenciar aquilo estando debaixo da pele do outro, ou seja, tendo tido a história que o outro teve e adquirido as ferramentas para enfrentar o mundo que foi possível para o outro adquirir.

Pessoas diferentes têm pontos fortes e fracos diferentes e o que pode ser fácil para um, pode ser extremamente difícil para o outro. Por exemplo, uma pessoa que é muito boa em negociação e que porventura ainda não tenha fortalecido as ‘musculaturas’ da flexibilidade e da empatia pode alimentar expectativas altas em relação à performance de pessoas cuja história de vida não incluiu o aprendizado de como negociar. Desalinhamentos de expectativa nessa seara podem fazer surgir e escalar conflitos que poderiam ter sido erradicados na base com doses preventivas de flexibilidade e empatia. O conflito é inevitável nas relações humanas, de modo que o desenvolvimento de habilidades como flexibilidade e empatia ajuda a superar esses obstáculos que dificultam a construção de vínculos mais profundos e significativos com as pessoas. E aqui cabe lembrar o famoso estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de Harvard que após décadas de pesquisa é enfático em afirmar que a qualidade de nossos relacionamentos é a variável mais importante na determinação da saúde e felicidade que teremos em nossas jornadas rumo ao envelhecimento.

Esse é um texto meramente informativo e que não tem o objetivo de substituir consulta por profissional especializado. Caso você tenha dificuldades no campo de seus relacionamentos afetivos, sugiro que você procure um profissional com conhecimentos teóricos e experiência prática na área.

Referências:

https://www.recantodasletras.com.br/cronicas/2812213

https://www.vagalume.com.br/raul-seixas/ouro-de-tolo.html

https://royalsocietypublishing.org/doi/10.1098/rspb.2017.1870#sec-2

https://www.adultdevelopmentstudy.org/

Texto de autoria do Psicólogo Alexandro Paiva.

Alexandro Nobre Paiva é Psicólogo Clínico, Psicoterapeuta Sexual e de Casais (CRP 06/118772) com experiência no atendimento de clientes brasileiros e estrangeiros adultos, nas línguas inglesa e portuguesa. Especialista em Terapia Comportamental Cognitiva em Saúde Mental pelo Ambulatório de Ansiedade do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (AMBAN IPq HC FMUSP) e pela Proficoncept, certificada pela DGERT (União Europeia). Título profissional de Especialista em Psicologia Clínica concedido pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), por meio do Conselho Regional de Psicologia do Estado de São Paulo (CRP/SP). Qualificação Avançada em Psicoterapia com Enfoque na Sexualidade pelo Instituto Paulista de Sexualidade (INPASEX). Capacitação em Reabilitação do Amor Patológico pelo Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (AMBULIM IPq HC FMUSP) e pela Escola de Reabilitação do Amor Patológico (ERA-AP). Membro da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC).

Especialista em Língua Inglesa: Metodologia da Tradução pela FAFIRE, tendo atuado como Professor de Língua Inglesa por cerca de 10 anos (Brasil e China) e convivido com pessoas de diferentes culturas, mantém um Blog com Recursos Psicoeducacionais nas áreas da Psicologia e da Sexualidade.

Interesses principais incluem Psicologia, Sexualidade, Tradução, Línguas Estrangeiras, Viagens e Fotografia.

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